terça-feira, 29 de junho de 2010

Revolta Ortográfica

não gosto de pontos finais!

embora reconheça que do ponto tudo começa, a geometria me diz que um ponto só não desenha, nem expressa movimento
no texto, então, é pura pretensão decidir o final com um ponto, como se nada mais houvesse a dizer ou pensar,


porque
as histórias não se esgotam em si mesmas, prefiro interrompê-las com pontos desdobrados em reticências animadas, lúdicas, caminhantes, teimosas ao rejeitar o esgotamento do ato, misteriosas ao ocupar o espaço dos segredos, visionárias ao apontar o que não se viu antes


se é pra continuar,
também posso usar as vírgulas , pontos unidos em desenho de curvas flexíveis, acolhedoras, com perfil de lua crescente,
pra dizer mais ou deixar pra quem lê a liberdade de colocar apostos, esclarecer, contestar, desvendar o que está por - vir...


com o ponto e vírgula tenho reservas, afinal ainda não entendi se o ponto sobe na vírgula para submetê-la a uma pausa maior ou se é a virgula que, num gesto de delicadeza, se coloca debaixo do ponto pra suavizar o hiato


na dúvida... bem, a tecla do ponto e vírgula aqui está semi-nova ...


até porque,
quem mora com eles no teclado é o dois pontos, hiato grave, um sopro ao contrário, uma pausa para dizer, organizar, esclarecer, citar
até digna,
mas pouco recorrente no desenho dos meus textos,
recheados de pausas-apartes-vírgulas e interrupções-reticências,
sígnos de sopro pra fora, em tempo e rítmo do meu respirar


aproveito o desabafo
pra reclamar o fim do trema, pontos em pas de deux sobre alguns palcos de us, para subverter o som de alguns qu_s e gu_s , rebeldia que as gerações futuras não vão praticar

- em ato de protesto, ainda escrevo com trema e apago pra publicar -

implico também com maiúsculas, 
gritos furando o tempo, quebrando o silêncio das pausas de pontos que continuam
e porque exaltam, igualmente, luz e sombra em verbetes


Amor, Compaixão, Lealdade, Gentileza, Arte, Poesia, ...
palavras essenciais ao espírito, algumas esquecidas, outras banalizadas,
essas sim demandam gritos de caixa alta nos textos...


© Direitos Reservados

8 comentários:

May Alek disse...

Adorei o texto! Leve, crítico, irreverente.
Só um adendo(?): os dois pontos form tão bem usados por Roland Barthes, para entrecortar, quebrar, em ritmo de sofreguidão.
Beijocas

Unknown disse...

Lou!
Achei de uma sutileza incrível!
Que vc possa utilizar muitas reticências e vírgulas em sua trajetória....e quanto ao trema ? Também lamento sua ausência...mas como aqui se mostra, as reticências exprimem a saudade!
Parabéns!!
Beijos,
Liz Cabral

marcita disse...

Que só tenha um ponto final, quando for para começar algo mais bonito.

Gostei muito do texto!

Um beijo!

Ada Gama disse...

Texto gostoso de ler, hein! Adorei!
Também não gosto nada de pontos finais - acho q tenho dificuldade p/ lidar com eles em todos os sentidos... Qto às reticências, olha elas aí de novo... Tentarei preenchê-las de boas ideias... Vamos ver se consigo. Bjs

Marcelo Pirajá Sguassábia disse...

Aceite os parabéns de minhas consoantes reticentes - se é que me permite a utilização delas! rsrsrsrsrsrsrs...
Um beijo pra você, Lou.

Eduardo Lara Resende disse...

Beleza de texto, Lou! Verdades não reticentes. Parabéns!

Anônimo disse...

Magnífico texto. Pessoalmente: emocionalmente não gosto de pontos finais; e esteticamente prefiro pontos de interrogação. É apenas um juízo estético-emocional, mas assino por baixo esta Revolta Ortográfica.

Paulo Emanuel disse...

Vamos por os pontos nos iis:
um ponto pode ser um começo, mas não tem que ser um fim.

(Gostei muito deste texto e vou partilhar no facebook)